Valencia, Espanha. Nao, nao estou de ferias. Trabalho sim. Profunda cura, terrivel viragem.
Por estes dias, encontro-me em frente ao computador, algures em Valencia. Que contar? Por onde começar? Nao sei bem que lhes diga.
Este navegar é longo e duro. Radical. E mostra-me como é bom viver do outro lado, desse lado. Num gabinete ou escritorio. Ar condicionado, hum, ar condicionado, quem nao tem?
Profunda cura porque aprendo a repensar oportunidades. Terrivel viragem porque ninguem acreiditaria ser possivel um encontro com o trabalho duro, forçado, impiedoso. Ninguem consegue imaginar a sensaçao de um final de dia destes. Nem contado. Nao vale a pena contar. Viver sim. Vivendo aprendo a perceber o outro lado. O lado daqueles que buscam os mesmos euros que lhes dao DVDs, fraldas, perfumes e carros em leasing.O lado de uma outra lua tantas vezes ignorada.
E ponho-me a pensar em todos vós que reclamais melhores salarios, menos horas de trabalho, mais creditos na carreira. Que seria de vós sem todos os outros que caminham entre os proprios musculos e nadam no proprio suor?
Navego por aqui e conto aportar em breve. Nao sei se isto é uma cronica ou simples disparate provocado por excesso de acido lactico. Nao sei se alguem perceberá bem isto.
E depois, um dia destes, eu conto um conto.
terça-feira, 24 de agosto de 2004
segunda-feira, 9 de agosto de 2004
domingo, 8 de agosto de 2004
eu acho
Eu acho muito bem que se debata a questão da ortografia. Há por aí dezenas de entendidos que colocam muito bem as palavras, direitinhas, afinadas, lindas de ver (quanto mais ler). O pior é o conteúdo, a hipocrisia. O elogio fácil e conveniente. O favor trocado e a puta da mesquinhez que faz desses bem falantes uma cambada de “agiotas do intelecto”.
sábado, 7 de agosto de 2004
quarenta euros
Ladino, subi as escadas e dei com um corredor escuro, cheio de portas que escondiam salas com escritórios silenciosos, quase inexistentes. Ao fundo já se via gente e, por isso, era quase certo que a sala 46 só podia ser ali.
- Boa tarde. É para se inscreverem para ir trabalhar no estrangeiro? - Era, pois era.
O casal de namorados, ansiosos, seriam os primeiros a entrar quando a porta se abrisse. O resto do grupo era composto por jovens de aspecto frugal e o cheiro a bafio imperava naquela atmosfera esquiva.
Decidi-me a quebrar o gelo e perguntei:
- Já alguém foi para o estrangeiro trabalhar? - Já, pois já.
Do outro lado da porta ouvia-se uma voz zangada:
- Eu não pago nada. Para isso fico aqui a apanhar sol que o fundo de desemprego que recebo vai dando para remediar.
Percebi o que se passava e avisei o grupo:
- Olhem que só para se inscreverem têm de pagar. E contem aí com cinquenta Euros.
- Pagar? Nem por sombras. Eu venho aqui é para trabalhar, atirou o namorado.
A porta abre, e surgem dois homens de aspecto curvo.
Velhos para isto, pensei eu. E eram, de facto, homens maduros, aparentando cinquenta anos ou mais. Um deles, o dono da voz zangada, sentenciou:
- Olhem que eles pedem quarenta Euros só para inscreverem um gajo na base de dados, e não garantem emprego. Nem passam recibos, os tipos. Quarenta Euros dão para muitos cafés.
O corredor quase esvaziou, tal a debandada. Menos o casal, que entretanto já tinha entrado.
Deixei-me ficar ali, conquistado por certa sede de experimentar, de conhecer, com todos os sentidos, aquela realidade.
Outros jovens vão chegando.
-Estou à espera de ser chamado para a Suiça. Só cá estou por causa do meu filho, mas vou ser chamado outra vez, dizia um que acabara de se juntar à molhada.
Cada um contava a sua história, enquanto aquela porta não se abria. Cada um mostrava a sua desgraçada condição de ter que partir.
«quarenta euros dão para muitos cafés»
E dão, sim senhor. E para outras coisas mais. Quarenta Euros nas mãos de quem não tem emprego decente, de quem não recebe a tempo e horas, de quem foi vítima de despedimentos colectivos, de falências fraudulentas, de multinacionais que fugiram, de subsídios que nunca mais chegam, servem para tudo menos para serem entregues, de bandeja, a meia dúzia de filhos da puta, uns abutres, que roubam “à má fila”. Roubam descaradamente o mais precário cidadão, criando empresas fantasmas de colocação de pessoal no estrangeiro. Publicam um anúncio no jornal e é só aguardar que os desgraçados batam à porta.
E o Estado? O que anda esse gajo a fazer por nós?
- Boa tarde. É para se inscreverem para ir trabalhar no estrangeiro? - Era, pois era.
O casal de namorados, ansiosos, seriam os primeiros a entrar quando a porta se abrisse. O resto do grupo era composto por jovens de aspecto frugal e o cheiro a bafio imperava naquela atmosfera esquiva.
Decidi-me a quebrar o gelo e perguntei:
- Já alguém foi para o estrangeiro trabalhar? - Já, pois já.
Do outro lado da porta ouvia-se uma voz zangada:
- Eu não pago nada. Para isso fico aqui a apanhar sol que o fundo de desemprego que recebo vai dando para remediar.
Percebi o que se passava e avisei o grupo:
- Olhem que só para se inscreverem têm de pagar. E contem aí com cinquenta Euros.
- Pagar? Nem por sombras. Eu venho aqui é para trabalhar, atirou o namorado.
A porta abre, e surgem dois homens de aspecto curvo.
Velhos para isto, pensei eu. E eram, de facto, homens maduros, aparentando cinquenta anos ou mais. Um deles, o dono da voz zangada, sentenciou:
- Olhem que eles pedem quarenta Euros só para inscreverem um gajo na base de dados, e não garantem emprego. Nem passam recibos, os tipos. Quarenta Euros dão para muitos cafés.
O corredor quase esvaziou, tal a debandada. Menos o casal, que entretanto já tinha entrado.
Deixei-me ficar ali, conquistado por certa sede de experimentar, de conhecer, com todos os sentidos, aquela realidade.
Outros jovens vão chegando.
-Estou à espera de ser chamado para a Suiça. Só cá estou por causa do meu filho, mas vou ser chamado outra vez, dizia um que acabara de se juntar à molhada.
Cada um contava a sua história, enquanto aquela porta não se abria. Cada um mostrava a sua desgraçada condição de ter que partir.
«quarenta euros dão para muitos cafés»
E dão, sim senhor. E para outras coisas mais. Quarenta Euros nas mãos de quem não tem emprego decente, de quem não recebe a tempo e horas, de quem foi vítima de despedimentos colectivos, de falências fraudulentas, de multinacionais que fugiram, de subsídios que nunca mais chegam, servem para tudo menos para serem entregues, de bandeja, a meia dúzia de filhos da puta, uns abutres, que roubam “à má fila”. Roubam descaradamente o mais precário cidadão, criando empresas fantasmas de colocação de pessoal no estrangeiro. Publicam um anúncio no jornal e é só aguardar que os desgraçados batam à porta.
E o Estado? O que anda esse gajo a fazer por nós?
segunda-feira, 2 de agosto de 2004
O filme “Carandiru”, brasileiro, bom, levou-me a pensar que um homem pode ser glorioso mesmo no mais cruel dos mundos. Naquela prisão havia de tudo, e cá fora tudo parecia ainda mais deprimente. Assim, a gloria desses homens não tinha nada a ver com a liberdade. Moral da história: que moral?
bom dia
Bom dia. Hoje fui à baixa do Porto e detive-me em frente ao café Imperial. Recuei vinte anos e percebi que a história repete-se. A história da nossa vida anda em eternos retornos. Olhei os vendedores ambulantes que me pareciam os mesmos de há vinte anos. Olhei os autocarros e ouvi o imenso ruido de uma cidade. O que andamos nós aqui a fazer, sós, no meio da multidão?
é de fugir ou não é?
não desatem a construir um país de "Vilas d'Este" - uma coisa colorida mas mal amanhada, mal pintada, que cedo desbota, precocemente se revela fraca, uma chatice sem nome
In blogame mucho
Li ali no Blogame mucho uma referencia à Vila D’ Este. Aquele aglomerado de prédios de muitas cores ( o sujo também lá está, essa cor sem tinta) mesmo à face da auto-estrada, antes de se entrar em Gaia. Também eu comprei lá um T2, numa época em que muitos jovens professores, engenheiros recém casados e outros tipos necessitados de casa própria, acreditaram naquilo.
E o tempo foi passando e as cores foram desbotando e os políticos foram mudando. E pior que os alicerces urbanos, da construção propriamente dita, foram os traços políticos, a régua e esquadro eleitoral, que lhe fizeram, à Vila D’Éste, e aos seus jovens inquilinos. Cruzaram os despejados de General Torres por via da nova estação ferroviária. Meteram lá alguns ciganos, injectaram aquilo que fora comprado e pago a taxas de juro altíssimas e “spreads” de 2.75, com inquilinos camarários, a pagar rendas simbólicas.
A droga e a violência não tardaram e os jovens inquilinos, recém licenciados, fugiram.
Pelos vistos a Vila D’Este é hoje um aforismo.
Continuo dono do T2, apesar de ter fugido também. E sempre que a vejo, à Vila D’Este, lembro-me que fui feliz ali, que ali nasceram os meus filhos e ali os vi darem os primeiros passos.
Alguém me sabe dizer se o senhor Menezes, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, e que se preocupa tanto com aquilo que o Rui Rio faz no outro lado do rio, vai fazer alguma coisa em concreto com aquilo, ou tenho que esperar por mais uma campanha eleitoral para ouvir uma palavra que seja, sobre aquele desastre urbanístico provocado, repito, pela desonestidade política dos nossos lideres ao longo destes últimos quinze anos?
É de fugir daqui não é?
Ou preferem que faça um poema?
In blogame mucho
Li ali no Blogame mucho uma referencia à Vila D’ Este. Aquele aglomerado de prédios de muitas cores ( o sujo também lá está, essa cor sem tinta) mesmo à face da auto-estrada, antes de se entrar em Gaia. Também eu comprei lá um T2, numa época em que muitos jovens professores, engenheiros recém casados e outros tipos necessitados de casa própria, acreditaram naquilo.
E o tempo foi passando e as cores foram desbotando e os políticos foram mudando. E pior que os alicerces urbanos, da construção propriamente dita, foram os traços políticos, a régua e esquadro eleitoral, que lhe fizeram, à Vila D’Éste, e aos seus jovens inquilinos. Cruzaram os despejados de General Torres por via da nova estação ferroviária. Meteram lá alguns ciganos, injectaram aquilo que fora comprado e pago a taxas de juro altíssimas e “spreads” de 2.75, com inquilinos camarários, a pagar rendas simbólicas.
A droga e a violência não tardaram e os jovens inquilinos, recém licenciados, fugiram.
Pelos vistos a Vila D’Este é hoje um aforismo.
Continuo dono do T2, apesar de ter fugido também. E sempre que a vejo, à Vila D’Este, lembro-me que fui feliz ali, que ali nasceram os meus filhos e ali os vi darem os primeiros passos.
Alguém me sabe dizer se o senhor Menezes, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, e que se preocupa tanto com aquilo que o Rui Rio faz no outro lado do rio, vai fazer alguma coisa em concreto com aquilo, ou tenho que esperar por mais uma campanha eleitoral para ouvir uma palavra que seja, sobre aquele desastre urbanístico provocado, repito, pela desonestidade política dos nossos lideres ao longo destes últimos quinze anos?
É de fugir daqui não é?
Ou preferem que faça um poema?
domingo, 1 de agosto de 2004
vou
Um tipo como eu tem de dizer umas coisas antes de encerrar um ciclo. Podia simplesmente dizer que foi bom e conheci muita gente e aprendi muito. Então pergunta-se: se foi bom, se conheceu muita gente, se aprendeu muito, porquê encerrar um ciclo? É verdade. Não existe justificação coerente, ou no mínimo, perceptível, para uma coisa destas, a não ser a "mudança". E é aqui que eu me quero situar para explicar que vou terminar um ciclo. Um ciclo de equívocos, de lutas. Uma página que se vira na minha viagem por este mundo.
De resto, chegado aqui, já fiz muito, creio. Já chapei massa, já acartei areia nas obras, já lavei copos e até já mudei fraldas a crianças deficientes. Já fui chefe, fui vendedor e empreendedor. Criei uma empresa e falhei. É isso. Falhei porque estou farto deste país miserável que apenas privilegia os amigos e os “certinhos”.
Creio que nesta terra não há lugar para gente como eu que, não sendo nada de especial, tem a particularidade de se apaixonar por coisas. E eu estou derretido de amores por mudar.
E é isso que vou fazer já neste mês de Agosto. Vou entregar a empresa, a empresa que criei, com o nome que eu lhe achei, à mesa de um restaurante. Vou acordar do sonho que vivi . Vou embora.
Não sei bem o que vou fazer, se vou dirigir uma força de vendas em Angola, se vou servir às mesas em Inglaterra ou se vou amarrar ferro para Espanha. Em Portugal não fico. Sei que vou embora. Cansei. Pronto, obrigado.
De resto, chegado aqui, já fiz muito, creio. Já chapei massa, já acartei areia nas obras, já lavei copos e até já mudei fraldas a crianças deficientes. Já fui chefe, fui vendedor e empreendedor. Criei uma empresa e falhei. É isso. Falhei porque estou farto deste país miserável que apenas privilegia os amigos e os “certinhos”.
Creio que nesta terra não há lugar para gente como eu que, não sendo nada de especial, tem a particularidade de se apaixonar por coisas. E eu estou derretido de amores por mudar.
E é isso que vou fazer já neste mês de Agosto. Vou entregar a empresa, a empresa que criei, com o nome que eu lhe achei, à mesa de um restaurante. Vou acordar do sonho que vivi . Vou embora.
Não sei bem o que vou fazer, se vou dirigir uma força de vendas em Angola, se vou servir às mesas em Inglaterra ou se vou amarrar ferro para Espanha. Em Portugal não fico. Sei que vou embora. Cansei. Pronto, obrigado.
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