quarta-feira, 25 de fevereiro de 2004

Fui ver a neve, “essa coisa branca” (a frase é do meu Alexandre, que transcrevo de uma “redacção” que ele fez o ano passado). Não segui, porém, os novos hábitos da pequena burguesia, não fui para a Serra da Estrela e, por conseguinte, não fiquei preso na estrada. A neve alva e surpreendentemente abundante que vi cair na Gralheira, aldeia mais alta da serra de Montemuro, foi um acontecimento para o meu filho. Viu a neve, nela brincou e eu fiquei ali a ver aquele mito a desmoronar-se no olhar de uma criança de 8 anos.

Eu já aqui escrevi um texto sobre aquela aldeia beirã que visitei em pleno Verão, cheio de todas as cores e alegrias, próprias da riqueza humana das aldeias portuguesas. Menos gente hoje do que outrora – não há imigrantes no Inverno – e sob muito frio, não foi só a neve a brilhar. Mais uma vez privei com o calor dos autóctones, dos que não viram as costas aquele bocado de terra agreste. Vi o gado sair das lojas apenas para beber a água que corre no ribeiro. E senti o calor humano, intenso, de pessoas que para muitos só cabem nos livros que ainda andam por aí, desde Torga a Trindade Coelho, Aquilino e Eça de Queirós. Na terra que foi berço de Geraldo comi comida sem igual e trouxe comigo mais histórias para contar, para me contar a mim próprio, desde as alheiras sabiamente preparadas pela dona Elisa, às quais me atirei logo pelas onze da manha, bem antes do cozido que me aguardava no Recanto dos Carvalhos, passando por uma não notícia que foi a caçada ao javali que chagou a estar a três metros do Alfredo mas cuja perícia do animal evitou aquilo que seria um autentico “hapening” na aldeia. O javali por lá continua a engordar à custa das leiras mas tem os dias contados, o pobre.

De maneiras que vivi uma boa jornada carnavalesca, sem o pindérico habitual do lixo televisivo a glosar-nos com as mais reles variações de um Carnaval “ made in” Brasil. Um reparo: estive muito perto de Lazarim e bem pena tive de não ter ido ver o cortejo dos caretos – isso sim o verdadeiro Entrudo. Fica para uma próxima oportunidade. O javali já não terá boa cara quando eu lá voltar.




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