As férias de Natal tinham chegado e Joel já sabia o que o esperava. Solidão.
Pausa na escola, interregno nos amigos, regresso àquelas paredes tristes e enormes, que preenchiam os vastos claustros do colégio interno. Não era um colégio normal, era a estrutura do Estado a garantir cama, mesa e roupa lavada a quem, por sortes, por desacertos conjugais e outros males trágico cómicos, ficava a cargo da Pátria, da alcofa que sobrara da antiga “Roda”. Muitos rapazes rumavam a casa, aos seus, porque ainda tinham alguém e viviam, de certo, um Natal como o de toda a gente.
Joel ficava à espera de Janeiro, como quem espera um comboio no pior apeadeiro do mundo. Passava o tempo a dormir e a ver filmes do Fred Astaire e Ginger Rogers, enquanto não vinham as seis da tarde e o jantar. Depois era ler. Ler qualquer coisa que houvesse, que falasse do mundo e doutros mundos.
As noites frias eram passadas a ouvir discos velhos, muito selectos para um puto como o Joel. The Doors, Génesis e Barcklay James Harvest faziam fila para tocarem em primeiro lugar. E lia as letras, o Joel, em sintonia com o que ouvia e sentia. E depois era Máximo Gorky e outras viagens. Paris e os “Boulevards” onde Sartre despertava no moço uma espécie de atracção fatal pelo desassossego.
Na noite de Natal, na véspera do nascimento do menino Deus, Joel vivia a sua “paixão”. Não percebia bem o seu presépio. Olhava em volta e só via pressa nos empregados do estado. Serviam o bacalhau triste e uma fatia de bolo-rei recesso, que já morava na despensa há dias, senão anos. Joel comia e regressava ao quarto, ao seu mundo. Falava com Nietzsche, e punha a tocar o “Pano-cru” de Sérgio Godinho. Do Sérgio daquele tempo, impetuoso e capaz de falar a todos os Joeis deste mundo. E adormecia a pensar em Janeiro.
Nunca mais era Janeiro.
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